No Brasil, chamamos de “Boa Noite Cinderela” quando alguém recebe uma bebida adulterada em festas ou bares e acaba dopado para ser roubado ou abusado. Aqui na Suécia, surgiu uma versão digital desse mesmo golpe: o dejtingrån (roubo de encontro). Em vez de drogas em copos, os criminosos usam perfis falsos em aplicativos de namoro para atrair vítimas.
O caso de Björklinge, Uppsala
Entre 2024 e 2025, um grupo de adolescentes em Uppsala atraiu homens para encontros combinados online. Mas em vez de romance, as vítimas encontraram violência: foram agredidas, amarradas, algumas colocadas no porta-malas do próprio carro e forçadas a entregar senhas bancárias. Em certos casos, o ataque durou horas e foi filmado pelos agressores.
O Tribunal de Uppsala condenou duas pessoas a quatro anos de prisão por roubo, sequestro e destruição de propriedade. Outros três receberam penas de ungdomsvård (medida socioeducativa sueca aplicada a menores), por envolvimento em roubo, agressão e intimidação de testemunha.
De “caça a pedófilos” a violência planejada
Os jovens justificaram seus atos como parte da chamada pedofiljakt (“caça a pedófilos”), uma prática na qual adolescentes dizem perseguir homens que procuram menores na internet. Mas investigações mostraram que, na prática, a maioria dos ataques tinha como alvo homens gays adultos, enganados por perfis falsos no Grindr.
Ou seja, a bandeira da “caça a pedófilos” servia como desculpa para justificar agressões, roubos e até chantagens. Muitas vítimas preferiram não denunciar por medo de terem sua sexualidade exposta — o que aumentou ainda mais a vulnerabilidade.
Comparando com o Brasil
Apesar das diferenças de método, a lógica é muito parecida com a do Boa Noite Cinderela no Brasil: conquistar a confiança da vítima, colocá-la em posição de fragilidade e depois agir com violência ou fraude. O que muda é o ambiente: no Brasil, o risco está em aceitar uma bebida em baladas; na Suécia, em confiar em um convite de aplicativo.
Um fenômeno internacional
Casos semelhantes foram registrados em Dinamarca, Áustria, Holanda e outros países europeus. Grupos juvenis se organizam para atrair vítimas através de aplicativos de namoro, especialmente voltados ao público gay, e depois as atacam. Em vários países, esse tipo de crime já é classificado como hatbrott (crime de ódio).
Cuidado
Para nós brasileiros na Suécia, essa história serve como alerta: os riscos que no Brasil aparecem em bares e festas, aqui estão escondidos nas telas do celular. Vale sempre desconfiar de convites fáceis demais. Procure marcar encontros em locais públicos e contar a alguém de confiança onde estará. E, acima de tudo, lembrar que vítimas têm direito a apoio psicológico e jurídico, sem precisar carregar o peso do medo e do preconceito sozinhas.